Por Antônio Diógenes – 19/09/2025
Comissão vê contradições em contrato de R$ 60 mil mensais e alerta para possível dolo eventual
Foto: Agência Senado / Senado Federal
Em depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS, realizado na quinta-feira (18), o técnico em contabilidade Milton Salvador de Almeida Junior negou ser sócio de Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, preso por comandar suposto esquema de fraudes em descontos indevidos em benefícios previdenciários. Salvador, convocado sem recorrer a habeas corpus, afirmou ter atuado apenas como prestador de serviços de assessoria financeira e rejeitou qualquer vínculo societário.
“Eu não sou, nunca fui e jamais serei sócio do senhor Antunes”, declarou logo no início. Segundo o depoente, seu contrato, no valor de R$ 60 mil mensais, foi firmado com a Prospect Consultoria Empresarial, para organizar pagamentos e recebimentos de empresas do grupo de Antunes. Ele acrescentou que seu nome figurou em estatutos como diretor financeiro apenas para viabilizar operações bancárias.
O relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), inicialmente elogiou a decisão de Salvador de comparecer espontaneamente e chegou a propor reavaliação do pedido de prisão preventiva. Contudo, após novas perguntas, o relator recuou, alegando que as explicações do contador não eram convincentes diante do alto volume de recursos movimentados. “Está difícil acreditar que alguém com formação financeira não tenha desconfiado das notas fiscais emitidas”, criticou.
Durante a sessão, parlamentares questionaram o depoente sobre a movimentação estimada em R$ 10 milhões mensais envolvendo associações como a Ambec (Associação dos Aposentados Mutualistas) e a CBPA (Confederação Brasileira dos Trabalhadores da Pesca e Aquicultura). Salvador alegou que apenas assinava documentos e que os controles eram de responsabilidade de setores internos e de uma contabilidade terceirizada, a Voga.
Ao ser confrontado com a possibilidade de ter assumido riscos ao continuar no cargo mesmo diante de indícios de irregularidade, o vice-presidente da CPMI, deputado Duarte Jr. (PSB-MA), alertou: “No direito penal, isso pode configurar dolo eventual: quando não há intenção direta, mas se assume o risco. O senhor pode ser responsabilizado pelo prejuízo de milhares de aposentados.”
Outros parlamentares reforçaram as críticas. O senador Izalci Lucas (PL-DF), contador de formação, afirmou não acreditar que Salvador desconhecesse as irregularidades. Já o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) disse não estar convencido da versão apresentada, classificando o esquema como “sofisticado demais” para ser conduzido sem participação consciente de profissionais experientes.
Em sua fala final, o presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), pediu foco na apuração. “Não vamos perder tempo em disputas ideológicas. Nosso dever é mostrar ao país quem roubou aposentados e pensionistas. Essa impunidade não vai permanecer”, afirmou.
O caso reforça a percepção de que o “Careca do INSS” estruturou uma rede de empresas para simular serviços — entre eles telemedicina e call centers — usados como fachada para movimentação financeira irregular. A Polícia Federal estima que milhões de beneficiários tenham sido lesados.
Os trabalhos da comissão continuam, com expectativa de ouvir nos próximos dias Romeu Carvalho Antunes, filho do “Careca”, apontado como sócio formal de diversas empresas ligadas ao esquema. A investigação segue monitorando a possibilidade de envolvimento de servidores públicos e de uso de empresas offshore para ocultar recursos desviados.
